Centro de Estudo e Pesquisas Clínicas de São Paulo

Prof. Dr. Zan Mustacchi

Protocolo Clínico de seguimento médico em síndrome de Down

Prof. Dr. Zan Mustacchi
Genética Médica – Pediatria

Todas as crianças necessitam realizar visitas periódicas ao médico pediatra a fim de que seu desenvolvimento e estado geral de saúde possam ser monitorados. Pelas mesmas razões e com mais motivos, a criança com síndrome de Down (SD) não deve ser privada deste tipo de atendimento.

A suspeita clínica da SD pode ser feita, por um médico experiente, logo após o nascimento, pelos sinais característicos na criança.

A consulta com o médico geneticista confirma a suspeita clínica, esclarece e orienta os pais sobre a síndrome, porém faz-se necessário a realização do cariótipo. Este exame pode ser feito a qualquer momento durante o primeiro ano de vida, pois sua importância está especialmente ligada ao aconselhamento do casal quanto ao risco de recorrência e praticamente nada vem a acrescentar para a criança, além de confirmar o diagnóstico, exceto em raríssimos casos (0,2%) de mosaicismo de baixíssima freqüência celular (menos do que 10% das células apresentando trissomia do cromossomo 21).

Passaremos a descrever alguns procedimentos que devem ser realizados com a finalidade de detectar ou prevenir, quando possível, condições que podem comprometer a qualidade de vida desses pacientes:

Ao nascimento na suspeita clínica

• Avaliação cardiológica com:

• Eletrocardiograma ECG;

• Raio-X de tórax com todos os arcos costais, frente e perfil;

• Ecodopplercardiografia bidimensional colorida.

Defeitos cardíacos congênitos constituem, dentre as malformações, as mais freqüentes na SD. Logo ao nascer, é imprescindível que se realize o ecodopplercardiograma independentemente de haver ou não suspeita de cardiopatia pelo exame clínico, pois em 50% dos casos que apresentam cardiopatias congênitas o exame clínico nada detecta. Problemas cardíacos têm sido identificados na vida adulta, podendo ocorrer mesmo em pessoas que foram operadas em idades precoces, na forma de um regurgitamento aórtico e insuficiência mitral, seqüela mais freqüente nesses pacientes e que pode trazer perda na qualidade de vida (Ferrer, Escobar e col). O raio-x de tórax deve apresentar 12 pares de arcos costais e há um a possibilidade, que ocorre entre 50 a 60% dos casos, de redução do 12o arco ou ausência deste, que deverá ser considerado na avaliação da dinâmica ventilatória e obviamente na evolução dos processos respiratórios que freqüentemente acometem estes indivíduos.

• Avaliação oftalmológica com:

• Fundo de olho;

• Afastar catarata e glaucoma.

É absolutamente recomendável um exame de rotina, logo após o nascimento, visando diagnosticar a presença de cataratas congênitas que devem ser removidas cirurgicamente o mais rápido possível e/ou outros problemas como a obstrução dos canais lacrimais. Obs: Evitar colírio de derivado atropínico.

• Avaliação otorrinolaringológica e audiológica com:

• Otoscopia (para avaliação do conduto auditivo);

• OEA (Otoemissões acústicas);

• BERA (Audiometria de tronco cerebral);

• Imitanciometria (timpanometria ou impedanciometria).

É necessário realizar, logo ao nascimento, cuidadosa avaliação auditiva (BERA – audiometria de tronco cerebral, além de OEA – Otoemissões Acústicas), devido a possíveis anomalias e disfunções que podem comprometer o ouvido médio e o interno. A necessidade de monitoramento da audição é defendida como sendo um dos principais fatores de garantia de uma linguagem mais funcional e discute-se a possibilidade de que o uso de hormônios para o crescimento possa ampliar a estrutura do ouvido garantindo um melhor escoamento e maturação dessa estrutura.

O item da apnéia obstrutiva de sono é apresentado como sendo uma das patologias presentes na SD e é defendida a necessidade de avaliação continuada das interrupções do sono e da oxigenação cerebral durante as crises em crianças de 3 a 4 anos para tentar diminuir as possíveis conseqüências dessa patologia para o desenvolvimento cognitivo, desempenho escolar, taxa de crescimento e alterações comportamentais como hiperatividade ou desatenção.

• Coleta do teste do pezinho.

• Ultrassom de abdômen global.

• Ultrassom de articulação coxofemural.

• Ultrassom de sistema nervoso central (encéfalo).

• Eventuais avaliações com especialistas.

• Rotina normal de recém-nascido.

Durante o primeiro ano

• Encaminhamento para um Programa de Intervenção Precoce, atualmente definido como Estimulação Essencial.

• Colher cariótipo.

• Investigar órgãos neurosensoriais.

• Avaliar perfil metabólico:

• Tireoidiano (TSH, T4 livre)

• Glicídico (carbohidrato, glicemia de jejum, hemoglobina glicosada, colesterol LDL, HDL, VLDL e triglicérides).

• Renal (uréia, creatinina, Na, K, urina I e urocultura com contagem de colônias e antibiograma).

Problemas da tireóide são comuns na SD (16 a 22%), sendo mais freqüente o hipotireoidismo congênito que deve ser detectado logo, para que possa ser tratado precocemente.

• Fazer ultrassom de vesícula biliar.

• Reavaliação audiológica e oftalmológica.

• Imunização com complemento (veja imunização no site: www.sindromededown.com.br )

O bebê com SD tem um calendário de vacinação mais abrangente que visa prevenir o mais amplo contexto infecto-contagioso estimulando o seu sistema imunológico às defesas.

• Rever avaliações com cardiologista, ortopedista, endocrinologista, neurologista, entre outros, caso necessário.

• Investigar refluxo gastroesofágico com Doppler colorido, EED e/ou Ph-metria.

• Fazer hemograma completo.

• Colher cálcio, fósforo e fosfatase alcalina.

• Complemento vitamínico e mineral de rotina pediátrica.

• Procurar inserir-se em um grupo de pais de crianças com síndrome de Down para apoio familiar.

A partir do primeiro ano:

• Rotina pediátrica regular.

• Avaliação odontopediatrica com revisões anuais.

• Avaliações oftalmológicas e audiológicas anuais até os 5 anos.

• Avaliação ortopédica na deambulação com atenção ao pé plano e instabilidade rótulo-femural.

• Raio-X de dinâmica cervical da articulação atlanto axial quando da capacidade de ficar em pé com apoio.

• Repetir o Raio-X de C1/C2 de dinâmica cervical aos 4 e aos 10 anos ou quando necessário.

• Acompanhar o desenvolvimento neuropsicomotor, além do crescimento de estatura, perímetro cefálico (PC) e peso, usando como parâmetros de normalidade curvas e gráficos específicos para esta população brasileira (ver curvas padrão da população brasileira com síndrome de Down, tese de doutorado do Dr. Zan Mustacchi no site: www.sindromededown.com.br ).

• Apoio psicopedagógico e educacional (berçário, creche, pré-escola e escola).

• Avaliação gastrointestinal para verificar possíveis malformações como: atresia duodenal (estreitamento do duodeno), distúrbios do aparelho digestivo, ânus imperfurado e outras, que são feitas rotineiramente em qualquer serviço imediatamente após o nascimento. Devendo ser realizado ultrassom de abdômen para, além de excluir cálculos de vesícula biliar (que ocorrem em aproximadamente 8% dos casos), afastar também anomalias nefro-urológicas, além de descartar síndromes desarbsortivas (situações metabólicas, principalmente digestivas que acarretam má absorção específica e consequente desnutrição), com pesquisa de anticorpo antigliadina e antiendomísio, além de outras provas digestivas e atenção à maior possibilidade de megacólon congênito.

• Perfil metabólico gonadal no início da puberdade.

• Apoio de profissional da saúde mental.

• Densitometria óssea a partir do fim da puberdade.

• Papa-nicolau e mamografia na jovem.

• PSA (exame prostático) e perfil prostático considerando-se o baixo risco de neoplasias sólidas em virtude de ter sido caracterizada uma elevação da endostatina (protetora de neoplasias) em indivíduos com síndrome de Down.

• Atenção à saúde mental dos distúrbios vinculados ao aumento do risco de demência do tipo Alzheimer prematuro em síndrome de Down.

Vários trabalhos da área da neurobiologia exploram as possibilidades de estudo da SD a partir de um modelo animal: o camundongo denominado Ts65DN trissômico no segmento 16 que contém genes homólogos aos da trissomia do 21 em humanos. Outro tipo de camundongo também tem sido explorado como um modelo mais adequado para investigação, o TgDyk1a, que apresenta aquisições motoras alteradas e comportamentos de hiperatividade. A principal vertente desses trabalhos é o tema do envelhecimento e o surgimento da patologia de Alzheimer demonstrando que nesses animais há amplas alterações no tamanho e forma de elementos pré e pós sinápticos nos padrões de inervação dos inputs GABAérgicos. Também tem sido exploradas as possíveis causas das degenerações dos neurônios colinérgicos mostrando que isso é devido à falha no transporte retrógrado do fator neurotrófico NGF, possivelmente vinculado a um gene específico que precisa ser localizado em trabalhos futuros para permitir tratamento clínico preventivo do envelhecimento associado às patologias. Sintomas como placas senis e neurofibrilas já estão presentes desde os 10 anos, com manifestação importantes entre os 30 e 50 anos, mas com rápido agravamento do quadro em apenas um ano no caso de pessoas com SD, contra três anos em pessoas sem síndrome de Down, após suas primeiras manifestações. Como estratégias compensatórias para o envelhecimento propõem-se a organização de ambientes enriquecidos que aumentam o crescimento de terminações nervosas e estimulam a sobrevivência de neurônios. Como prosposta de terapêutica coadjuvante à estimulação ambiental tem sido proposto o uso do medicamento Donepezil que demonstrou ser eficaz no retardo do surgimento de disfunções cognitivas em alguns pacientes, mas esses resultados segundo o DSMIG (Down Syndrome Medical Interest Group) precisam ser mais bem investigados.

Como é reconhecida a maior sensibilidade das células trissômicas ao estresse que pode ser causado por um desequilíbrio no metabolismo do peróxido de hidrogênio, se discute o uso de terapias antioxidantes, como o uso da vitamina E como forma preventiva de Alzheimer. Na última reunião do DSMIG desmistificou-se a idéia de que medicamentos atualmente usados em pacientes com Alzheimer podem beneficiar pessoas com SD nos primeiros anos de vida. Atualmente privilegia-se os dados vindos de modelos animais sobre envelhecimento neuronal, sensorial e do uso preventivo de medicamentos para essas alterações que podem diminuir a qualidade de vida de pessoas com síndrome de Down.

• Programa de apoio à autonomia social projetando uma vida no modelo de residência assistida.

Uma proposta muito interessante para capacitar profissionais na área da saúde e educação é o Curso de Especialização em Síndrome de Down que visa treinamento e capacitação para o diagnóstico e atendimento. Solicite maiores informações por e-mail: cursoespecializacao@sindromededown.com.br.

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